sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

A excêntrica vida de Lupicino Gerundiano (Parte 1)


PS: essa peça é uma ficção. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

Patrocínio: Grife BM´s sun glasses

EL ANTIFAZ DRAMATURGIA APRESENTA:

UMA PRODUÇÃO DE: Melina Passos

A EXCÊNTRICA VIDA DE LUPICINO GERUNDIANO

"Amor, só de mãe. Paixão, só de Cristo. Quem quiser me amar, sofra ofra ofra."

PERSONAGENS:

LUPICINO GERUNDIANO: jovem alto, pálido, cabelo rubro, voz grave, temperamento forte.
MANOEL DA PADARIA: pai de Lupicino, baixo, moreno, bigodudo, medroso.
MÃE: mãe de Lupicino, alta, branca, ruiva, temperamento forte.
ERASMO: gato de Lupicino, Pêlo amarelo e branco.
IRMÃO MAIS VELHO: irmão de Lupicino, pessoa folgada.
GARÇOM: garçom do boteco
VELHA: macumbeira da região
LOUCA: senhora embriagada
MARTINI: empresário

CARUARU-PE, 2010

PRIMEIRO ATO [música de Billie Holiday]

CENA 1: [Ouve-se gritaria pela casa]

MANOEL DA PADARIA: [entrando desesperadamente no quarto de Lupicino e trancando a porta]

"Lupicino! Me ajuda, por favor! Preciso me esconder."

LUPICINO:

"Mas que diabos está acontecendo nessa casa?"

MANOEL DA PADARIA:

"Tua mãe, Lupicino! Ela quer me bater. Não deixa ela entrar!"

LUPICINO:

"Era só o que faltava! Vai, sai daqui. Não quero saber de defunto no meu quarto."

MÃE DE LUPICINO: [portando uma faca]

"Segura esse desinfeliz! É hoje que eu acabo com a raça dele!"

MANOEL DA PADARIA:

"Estás vendo, Lupicino? Ela está fora de si. Não abra essa porta."

LUPICINO:

"Oras, pensas tu que isso é programa da Marcia Goldschimidt? Vós que resolvais vossos problemas. Retirar-me-ei daqui em busca de paz. E tem mais uma coisa: homem frouxo tem mais é que apanhar de mulher mesmo. [sai do quarto e deixa a porta aberta]

Cena 2:

[Lupicino vai ao banheiro, mas se depara com a porta trancada. Vai no outro banheiro e, a mesma coisa. Resolve bater na porta]

LUPICINO:

"Quem defeca?"

IRMÃO MAIS VELHO:

"Sou eu"

LUPICINO:

"Por que hesitas tanto em libertar essa bosta dos infernos que habita teu cu bolorento? Quero dar uma mijada."

IRMÃO MAIS VELHO:

"Problema teu. O cu é meu e cago quando quiser."

LUPICINO:

"Ratazana. Preciso sair dessa casa. É muito cu pra pouco banheiro. Preciso de um mijador só pra mim." [senta no sofá e abraça seu gato Erasmo]

ERASMO:

"Miau."

LUPICINO:

"Também cansei dessas ratazanas, Erasmo. Quando a porta do banheiro se abrir, essa casa vai feder mais do que desodorante vencido no subaco.

[barulho de descarga]

IRMÃO MAIS VELHO: [saindo do banheiro feliz]

"Ah, como é bom respirar ar puro..."

LUPICINO:

"Pois o único ar que eu respiro aqui é o ar do teu cu, Ó diabo. Tinhas que abrir a porta do banheiro depois de parir tua merda diarrenta? Devias era ter colocado uma placa 'Interditado por dois dias'."

IRMÃO MAIS VELHO:

"E tua merda cheira a Dior, suponho."

LUPICINO:

"Exato. Na última conversa que eu tive com o Christian, ele pediu para que eu lhe enviasse um fax com o número da minha conta pra depositar a minha parte pela contribuição no último perfume lançado pela grife."

IRMÃO MAIS VELHO:

"Tu és tão rude e ficas te fazendo de phyno. Chegas nos lugares falando alto e cantando como se não houvesse amanhã. De cada dez frases tuas, nove possuem pelo menos um palavrão ou ofensa pessoal."

LUPICINO:

"Sou educado, oras. Por obséquio, tome no seu cu, sim?"

IRMÃO MAIS VELHO:

"E ainda se acha engraçado, aposto. Acha-se o máximo emitindo palavras de baixo calão e ofensas primitivas como "cu". É muita hipocrisia de algumas pessoas ao tentar se passar por phynas quando no fundo só sabem falar palavrão."

LUPICINO: [levantando-se, alterado]

"Bom se o problema do palavrão é comigo, tome no seu com uma vara dobrada 3 vezes, rode e dance a macarena, depois quede bem no olho da roda de sansara. Que idiotice, todo mundo fala palavrão, todo mundo tem um cu. Isso sim é hipocrisia: negar a existencia do furo. Venha, Erasmo. Vamos sair daqui. Não quero que te mistures com essa gentalha. /florinda"

ERASMO: [fazendo careta]

"Miau! Miau! Blrrr."

[Lupicino sai da casa com o gato]

CENA 3:

[Lupicino encontra um matagal, onde consegue mijar em paz. Logo depois, acende um cigarro e caminha pelas ruas com seu gato na noite de inverno]

CORAL:

"Is this the real life?
Is this just fantasy?
Caught in a landslide
No escape from reality
Open your eyes
Look up to the skies and see
I'm just a poor boy (Poor boy)
I need no sympathy
Because I'm easy come, easy go
Little high, little low"


LUPICINO:

"Anyway the wind blows, nothing realy matter to me. To me..."

[entra no boteco]

GARÇOM:

"Olá, Lupicino. o que vais querer hoje?

LUPICINO:

"Uma dose de tequila 100% agave pra mim e uma xícara de leite pro gato."

GARÇOM:

"Desculpa, não trabalhamos com laticínios."

LUPICINO:

"Que decadência, hein. Com tanta vaca nessa cidade, era de se esperar que a oferta de leite fosse maior. Bom, mas sendo assim, duas doses de tequila 100% agave."

GARÇOM:

"O gato vai beber tequila?"

LUPICINO:

"Mas é claro, oras. Faremos um brinde em homenagem a Paola Bracho, em seguida o ritual com sal e limão, botaremos pra dentro de uma vez só a "margosa" e cantaremos 'La Cucaracha' versão Calipso na joça. O Erasmo interpretará a Joelma, dando gritinhos esparsos durante a canção, e eu serei o Chimbinha visual coccon".

[Garçom sai e volta com o pedido. Lupicino toma as duas doses de tequila]

LUPICINO:

"É como eu te disse, Erasmo. Esse ano...esse ano tudo vai mudar. Ano passado ó...já era. Está tudo acabado. Nada mais importa. Nada mais importa...As pessoas olham pra mim e pensam talvez que eu sou de outro planeta. Imagina só, Erasmo. Vontade de dizer 'Não. sou daqui mesmo. Nasci no meio dessa imbecilidade.'

ERASMO:

"Miauuu."

LUPICINO:

"Nada mais importa...Não existe inocente nesse mundo. Não existe inocente, o que existe é esperto ao contrário /estamira. Chega!"

LUPICINO: [chamando o garçom]

"Emily, traga mais tequila, sim?"

GARÇOM:

"Aqui está. Não me chamo Emily."

LUPICINO:

"Emily, o gato tem sede. Faça alguma coisa."

GARÇOM:

"Já disse que não trabalhamos com laticínios. Mas posso trazer um pouco de água."

LUPICINO:

"Não. Hoje nós queremos nos embriagar. Não terias por acaso algum vinho? Mas tem que ser francês, o Erasmo é muito exigente. Desde o dia em que eu o ensinei a miar em francês, ele cismou em comer os caracóis do quintal lá de casa, pensando que eram scargot."

GARÇOM:

"Não temos vinho francês, mas temos um português."

LUPICINO:

"Deixe-me ver."

[o garçom traz o vinho]

GARÇOM:

"Vinho Periquita. Tinto seco, elaborado com uvas viníferas tintas européias. É muito bom. Estamos com um preço promocional de 20 reais a garrafa."

LUPICINO:

"Mas veja se eu vou dar 20 reais numa periquita. O Erasmo não aprovou o produto. Saia da minha frente, Emily."

GARÇOM:

"Eu já disse que meu nome não é Emily."

LUPICINO:

"Sei disso. Emily é o arquetipo do serviçal/subalterno, by Miranda Priestly."

GARÇOM:

"Nossa, que engraçado."

LUPICINO:

"Aliás, traga-me logo a conta. Sabe de uma? Vou sair dessa birosca. Como diria Bia Falcão: pobreza pega. E um boteco que não serve vinho francês, não merece meu respeito nem o respeito de Edite Piaf. /rica"

GARÇOM:

"Haha. Sertanejo do Nordeste tirando onda de gringo. Era só o que faltava pra terminar minha noite."

LUPICINO:

"Não me confunda com tua infância, calango safado. Traga logo esse diabo dessa conta que não quero tardar a partir desse boteco de quinta."

ERASMO:

"Miô."


CENA 4:

[Lupicino, embriagado, erra pelas ruas com o gato, e não consegue se lembrar do caminho de casa]

LUPICINO:

"Não se aflija, amigo. Como diria o Mestre dos Magos: O caminho de volta pra casa está mais perto do que vocês imaginam, crianças."

ERASMO:

"Miau."

LUPICINO:

"Mama, ooh
Didn't mean to make you cry
If I'm not back again this time tomorrow
Carry on, carry on as if nothing really matters
Too late, my time has come
Sends shivers down my spine
Body's aching all the time
Goodbye, everybody
I've got to go
Gotta leave you all behind and face the truth
Mama, oooooooh (Anyway the wind blows)
I don't want to die
Sometimes wish I'd never been born at all

[Erasmo começa a correr]

LUPICINO:

"Uni! Volta aqui, unicórnio safado!" [corre atrás do gato]

CORAL:

I see a little silhouetto of a man
Scaramouch, Scaramouch, will you do the Fandango
Thunderbolt and lightning, very, very frightening me
(Galileo) Galileo (Galileo) Galileo, Galileo Figaro
Magnifico-o-o-o-o
I'm just a poor boy nobody loves me
He's just a poor boy from a poor family
Spare him his life from this monstrosity

Easy come, easy go, will you let me go?
Bismillah! No, we will not let you go
Let him go
Bismillah! We will not let you go
Let him go
Bismillah! We will not let you go
Let me go (Will not let you go)
Let me go (Will not let you go) (Never, never, never, never)
Let me go, o, o, o, o
No, no, no, no, no, no, no
(Oh mama mia, mama mia) Mama Mia, let me go
Beelzebub has the devil put aside for me, for me, for me!

LUPICINO: [correndo atrás do gato]

"So you think you can stone me and spit in my eye
So you think you can love me and leave me to die
Oh, baby, can't do this to me, baby
Just gotta get out, just gotta get right outta here"

[gato encontra a casa e eles param de correr]

LUPICINO:

"Uni, achaste o caminho de casa!

Nothing really matters
Anyone can see
Nothing really matters
Nothing really matters to me"

CORAL:

"Anyway the wind blows..."

LUPICINO:

"Vai, larga do meu pé, coral dos infernos!"

[coral sai]

LUPICINO:

"Por hoje chega. Já aconteceram muitas coisas extravagantes pra um dia só. Vou tomar um comprimido de lexotam e apagar que nem vela de bolo de aniversário."

[Lupicino avista uma senhora de idade colocando um banquete na porta de sua casa. Ele esfrega os olhos para ver melhor e conclui que se trata de um despacho. Não pensa duas vezes e chuta as iguarias, jogando o prato de farofa no rosto da senhora]

LUPICINO:

"Mas o que é isso agora hein? Tome seu rumo e rapa daqui, sua velha macumbeira! Vá colocar despacho na casa do satanás!"

[A senhora sai, assustada]

LUPICINO:

"Mas será possível que não se tem paz nessa cidade? Isso só pode ser coisa da infeliz da minha ex. Ficou com o cu pipocando quando eu disse pra quenga que botei uns chifres nela. Tenho culpa se é verdade? Nego pede pra ser sincero e depois não quer ouvir. E ainda tem a ousadia de me mandar esses exus pra me infernizar. Por mim, quero mais é que prendam uma bomba no pé da rapariga e que ela se exploda. /binladen"


CENA 5:

[Festa de aniversário de uma cinquentona. Lupicino é contratado pra cantar músicas de Roberto Carlos e coisas do gênero]

LUPICINO:

"Quando eu estou aqui
Eu vivo esse momento lindo
Olhando pra você
E as mesmas emoções
Sentindo...
São tantas já vividas
São momentos
Que eu não me esqueci
Detalhes de uma vida
Histórias que eu contei aqui...
Amigos eu ganhei
Saudades eu senti partindo
E às vezes eu deixei
Você me ver chorar sorrindo...
Sei tudo que o amor
É capaz de me dar
Eu sei já sofri
Mas não deixo de amar
Se chorei ou se sorri
O importante
É que emoções eu vivi...

Hehe. São tantas emoções.../roberto

[Uma mulher começa a cantar animadamente, tão alto que chega a atrapalhar o trabalho do cantor]

LOUCA:

"Amigos eu ganheiiiiiiiiiii...saudades eu senti partindoooo..."

LUPICINO:

"Alguém por gentileza pode tirar essa louca daqui?"

LOUCA:

"E às vezes eu deixeeeeeeeeei você me ver chorar sorrindooooooooo!!!!!!!"

LUPICINO: [ao microfone]

"Peço perdão à platéia, mas não tenho a menor condição de continuar a cantar com a exaltação desta senhora."

MARTINI: [em particular]

"Cara, essa é a irmã da aniversariante. Dá um desconto."

LUPICINO:

"Vixi. Cambada de família de doido."

[Lupicino continua, tentando prender o riso ao ver o espetáculo da mulher embriagada. Ao final da apresentação, Martini o aborda]

MARTINI:

"Posso falar contigo?"

LUPICINO:

"Pois não. Mas seja breve, hoje estou com vontade de meter a mão na cara de um."

MARTINI:

"Deixa eu me apresentar. Meu nome é Martini."

LUPICINO: [estendendo a mão]

"Lupicino Gerundiano."

MARTINI:

"E não sei? Ouvi falar de ti uma vez, fiquei interessado e apareci aqui para conferir. Estou precisando de músicos para contrato de longa duração e quero te fazer uma proposta."

LUPICINO:

"É o tipo da coisa: a gente é músico em início de carreira mas não aceita qualquer oferta não. Por exemplo, ter que lidar com senhoras na menopausa. Descobri hoje que não tenho vocação pra funcionário do INSS."

MARTINI:

"Haha. Tranquilo. Nada de senhoras. A proposta se trata de uma viagem internacional. Não sei se esse tipo de mudança cabe nos seus planos, mas talvez essa seja a oportunidade para expandir suas fronteiras e mostrar seu talento."

LUPICINO:

"A conversa começa a ficar interessante. Noite passada tive uma reunião com John Coltrane e ele me disse: 'You must visit New York!".

MARTINI:

"Bom, não era bem isso que eu tinha em mente. Amanhã, eu e um grupo de músicos partiremos para Pedro Juan Caballero, no Paraguai, uma cidade muito movimentada e bem turística. Eu comprei um bar antigo, mas muito bem localizado, e irei reformá-lo. Colocarei alguns músicos para tocar à noite, todos os dias, serviremos bebidas e talvez comida. Cada dia exibiremos um estilo diferente de música, assim observamos qual é o estilo mais aprovado e então nos focaremos nele adiante. Será um sucesso, não achas?

LUPICINO:

"Ah, tá. Logo vi que um sujeito chamado Montilla não poderia fazer uma proposta à minha altura. Tinha que ser coisa de pirata e pirataria. Desde quando ir para o Paraguai significa fazer uma viagem internacional? Aquilo é praticamente o cu da Amazonia. Um músico que se preze faz o seguinte itinerário: Buenos Aires - Paris - Nova Iorque. Paraguai não está no meu roteiro."

MARTINI:

"Não é Montila, é Martini, rs. Mas eu pensei que tu fosses um músico de vanguarda. Tipo, deixar de lado esse mito de que o bom artista tem endereço marcado, uma vez que o importante é o talento, e não o lugar. Poderias fazer muito sucesso no Paraguai, tornar-se uma celebridade latina, e logo depois, ires pra onde quiseres. Além do mais, de Pedro juan pra Buenos Aires é um pulo, não tardarias a lograr tua viagem. Imagina só que fascinante, o nordestino que migrou para o sul da América com um projeto totalmente inovador sem nenhuma expectativa, e acabou cativando os nativos."

LUPICINO:

"Não sei, preciso pensar. O que Amy Winehouse faria nessa hora?"

MARTINI:

"Partiremos amanhã cedo. Não tens muito tempo pra pensar."

LUPICINO:

"Está bem, combinado. Decidi aceitar porque preciso sair de casa. Muito cu pra pouco banheiro. E além disso, gosto do perigon do CAC paraguaio."

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